
As indústrias do Ceará têm nos países árabes um mercado-alvo promissor e de alta demanda por exportação. É o que aponta o novo relatório lançado pelo Centro Internacional de Negócios (CIN) da Federação das Indústrias do Estado do Ceará (FIEC), intitulado “Mercado Árabe em Foco” (acesse aqui na íntegra). Com uma população jovem, alto poder aquisitivo e uma forte dependência de importações, especialmente de alimentos, a região deve se apresentar cada vez mais como um terreno fértil para a expansão comercial cearense.
O estudo revela oportunidades reais para a exportação de frutas tropicais, pescados, calçados, produtos minerais e têxteis. Mais do que volume, o mercado árabe demanda produtos com valor agregado, apelo cultural e compromisso com a sustentabilidade. O Ceará tem desenvolvido esses atributos com crescente competitividade.
“A combinação entre o perfil importador dos países árabes e o portfólio produtivo do Ceará, ainda subaproveitado em diversos mercados da região, revela uma janela de oportunidade para a ampliação da presença comercial cearense”, destaca o texto do estudo. Em 2024, as exportações cearenses para os países árabes somaram US$ 12,2 milhões, uma movimentação ainda modesta no comércio bilateral, mas com uma pauta qualificada.
O mercado árabe é composto por 22 países membros da Liga dos Estados Árabes (LEA), que abrange Oriente Médio, Norte da África e Chifre da África, e reúne cerca de 450 milhões de habitantes, o equivalente a 6% da população mundial, com um Produto Interno Bruto (PIB) agregado de US$ 3 trilhões. Esses países compartilham elementos culturais, religiosos e linguísticos, como a predominância do idioma árabe e da religião islâmica, que influenciam os padrões de consumo.
“O mundo árabe não é apenas uma possibilidade futura, é um mercado-alvo estratégico e acessível para empresas cearenses que se preparem técnica, cultural e institucionalmente para atender às exigências de um dos blocos mais dinâmicos do comércio internacional contemporâneo”, enfatiza outro trecho do material divulgado pelo CIN.
A corrente de comércio entre o Brasil e os países da LEA atingiu US$ 31 bilhões em 2024, apresentando um superávit histórico para o Brasil. Os principais parceiros comerciais brasileiros na região são Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos, Egito, Argélia e Marrocos. O agronegócio nacional domina as exportações, impulsionado pela alta dependência externa de alimentos dos países árabes. Setores como carnes (com destaque para a certificação Halal), açúcar, cereais e oleaginosas representaram mais de 60% do valor total exportado em 2024.
Há um crescimento gradual em segmentos não tradicionais como cosméticos, vestuário, setor mineral e frutas tropicais, áreas com potencial competitivo para o Ceará.
A influência Halal e as exigências de acesso
Conforme aponta o relatório, o islamismo impõe preceitos que vão além da religião, regulando aspectos culturais e econômicos. Para exportar para o mundo árabe, é fundamental compreender as normas religiosas islâmicas, que determinam o que é lícito (Halal) e proibido (Haram). Essas normas impactam alimentos, bebidas, cosméticos, medicamentos, logística, embalagens e, em alguns casos, vestuário e calçados.
Portanto, investir na certificação Halal — o que é permitido — assegura a conformidade com normas que abrangem composição, produção, abate (para produtos de origem animal) e a cadeia logística dos alimentos. É um selo de conformidade cultural, sanitária e ética, cada vez mais valorizado globalmente. O setor de alimentação Halal movimenta US$ 1,4 trilhão por ano, com 1,9 bilhão de consumidores potenciais, especialmente nos países árabes. As exigências Halal incluem rastreabilidade total, segregação entre produtos Halal e não Halal, boas práticas de fabricação, certificação por auditorias reconhecidas, abate ritual (para produtos de origem animal) e rotulagem adequada, preferencialmente em árabe e com linguagem neutra. O Brasil já é o maior exportador global de proteínas Halal.
“Produtos alimentícios devem, obrigatoriamente, possuir certificação Halal, assegurando conformidade com normas que envolvem não apenas a composição, mas também o abate, a produção e a cadeia logística dos alimentos”, alerta o relatório.
Além da certificação Halal, as empresas exportadoras precisam adaptar embalagens, composição, linguagem e estética dos produtos, especialmente em mercados mais conservadores. A rotulagem em árabe é frequentemente obrigatória. Exigências fitossanitárias rigorosas e normas específicas de países como SASO (Arábia Saudita) e GCC/GSO (Emirados Árabes Unidos, Catar) também devem ser cumpridas.
Alimentos
A demanda crescente por alimentos impulsiona as exportações cearenses. As frutas tropicais são um destaque, com US$ 4,4 milhões exportados em 2024, principalmente melões e castanha de caju. Há demanda por frutas premium e fora de safra local, especialmente em mercados de alto poder aquisitivo. A castanha de caju, valorizada em datas religiosas, atende ao perfil de consumo regional, com potencial de expansão para nichos premium. Pescados e crustáceos, mesmo com queda em 2024, têm potencial de retomada, dado o alto consumo per capita na região, que é deficitária em produção local. O mercado busca produtos premium e certificados. Biscoitos e preparações alimentícias apresentaram um crescimento exponencial de 597% em 2024, totalizando US$ 387,5 mil, revelando forte aceitação.
Moda
O setor de calçados, embora tenha registrado queda em 2024, encontra oportunidades em mercados com alta população imigrante, como os Emirados Árabes Unidos, que demandam calçados casuais e urbanos adaptados ao clima. Para competir com fornecedores asiáticos, é necessário reposicionamento em design, leveza e custo-benefício. Tecidos de algodão, especialmente mistos com fibras sintéticas, tiveram um crescimento significativo de 232% em 2024, impulsionados pelas exportações para Marrocos e Tunísia. O Ceará pode se posicionar como fornecedor de insumos têxteis para fábricas locais, aproveitando a posição estratégica do Magrebe.
Produtos da Mineração
A magnésia calcinada, utilizada na construção civil e siderurgia, é um produto mineral com presença crescente nos mercados árabes, impulsionada por megaprojetos de infraestrutura. As exportações desse item cresceram 107,2% em 2024, totalizando US$ 883 mil.
Sustentabilidade e valor Agregado
A demanda por produtos com valor agregado, rastreabilidade, padronização industrial e compromisso com a sustentabilidade posiciona o Ceará como fornecedor viável. Produtos como snacks saudáveis, cosméticos naturais, óleos essenciais e soluções cosméticas de base vegetal encontram sinergia com os padrões de consumo, que valorizam conveniência, autenticidade e sofisticação.
Vantagens logísticas e canais de venda
O Ceará apresenta vantagens logísticas relevantes devido à sua posição geográfica estratégica e à infraestrutura do Porto do Pecém. O porto, integrado a hubs logísticos globais, permite tempos de trânsito eficientes para os países do Golfo, em média de 18 a 25 dias, tornando viável a exportação de produtos com maior exigência logística.
Os canais de venda nos países árabes mesclam grandes redes de hipermercados (como Carrefour e LuLu) e redes gourmet com o avanço rápido do comércio eletrônico, especialmente entre consumidores jovens e conectados.
Caminhos para a expansão
Para ampliar a presença comercial na região, as empresas cearenses precisam atender a requisitos técnicos, sanitários, logísticos e culturais. A diversificação da pauta exportadora exige adequação estratégica e inteligência comercial aplicada. Investir em inteligência comercial, certificações específicas (notadamente Halal) e ações de marca internacional é fundamental para consolidar o posicionamento do estado como fornecedor.
A publicação conclui que o mercado árabe não é apenas uma possibilidade futura, mas sim um mercado-alvo estratégico e acessível para as empresas cearenses que se prepararem técnica, cultural e institucionalmente para atender às exigências desse bloco dinâmico do comércio internacional.
Mundo Árabe em debate: FIEC é sede de seminário aborda o tema
As oportunidades de negócios com o mercado árabe serão o centro dos debates do Seminário Brasil – Países Árabes: Conectando o Ceará às Oportunidades Internacionais, que ocorre na próxima terça-feira (03/06), das 9h às 12h, na Casa da Indústria. O encontro é gratuito e as vagas são limitadas. A iniciativa é uma realização da Câmara de Comércio Árabe-Brasileira e do Halal do Brasil, com apoio do CIN e do Governo do Estado do Ceará, por meio da Secretaria das Relações Internacionais.
A programação inclui painéis sobre economia, cultura de negócios, certificação Halal e casos de sucesso, além de um espaço dedicado ao networking com especialistas e representantes do setor.